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50 anos do hip hop: a história do movimento que mudou a música

Conheça a história do movimento que mudou a história da música. Passando pela fundação do hip hop nos Estados Unidos até a sua chegada no Brasil e a evolução do rap até os dias de hoje.

Há 50 anos, mais precisamente em agosto de 1973, nascia no Bronx a cultura hip hop. Para abrir bem esse texto, é importante salientar que o hip hop não é só o rap. O rap faz sim parte da cultura hip hop, e é um elemento importante dela, no entanto, ele não é a sua única forma de expressão. Segundo Afrika Bambaataa, um dos padrinhos do movimento, o hip hop tem a sua base em 5 elementos: o breakdance, o grafite, o DJ, o rap e o conhecimento/mensagem.

Esclarecido os fatos, vamos para a história do hip hop. O movimento nasceu em 1973, mas já vinha sendo ensaiado desde os anos 1960 com os Panteras Negras e o Movimento dos Direitos Civis nos EUA. Em um contexto onde a Guerra do Vietnã eclodia, o presidente Richard Nixon declarava guerra às drogas e a pobreza, o racismo policial e as brigas de gangues tomavam conta das periferias de Nova York, estar na rua era uma das únicas formas de lazer e contestação da população negra e latina do bairro do Bronx.

Foi ali, inclusive, que os irmãos Cindy e Clive Campbell, que depois ficou conhecido como DJ Kool Herc, organizaram a fatídica festa que inaugurou simbolicamente o hip hop em 13 de agosto de 1973 ao juntar três elementos base do movimento em um só lugar: um DJ, b-boys e b-girls dançando break e um MC. Você consegue ter uma noção de como aconteceu essa festa assistindo a série The Get Down, disponível na Netflix.

Mas falando mais a fundo sobre quem organizou essa festa, não tem como mencionar o DJ Kool Herc sem citar a sua origem jamaicana, da qual o hip hop, consequentemente, também bebeu. Isso porque em Kingston, capital da Jamaica, a cultura do sound system, que reunia centenas de pessoas em volta de caixas de som, e a do toaster, onde os DJs e o público rimavam por cima das batidas das músicas, eram comuns e Herc trouxe essa herança para dentro das festas que organizava.

Especificamente na festa de agosto de 1973, Herc resolveu inovar o seu set ao tocar dois LPs iguais ao mesmo tempo e isolar as batidas graves de um lado e deixar rolar outros elementos sonoros do outro. Dessa forma, ele reproduzia versões instrumentais únicas de discos de funk, rock e ritmos latinos da época enquanto um MC conseguia rimar por cima da cadência da música. Formando assim a base do que a gente conhece hoje em dia como rap. Uma das primeiras músicas que estourou nesse esquema foi Rapper’s Delight, do The Sugarhill Gang, que usa como batida base Good Times, da banda de disco music Chic.

Além de Herc, outra figura importante para a história do hip hop foi Grandmaster Flash, que foi responsável por popularizar nas festas do Bronx o scratching, que foi criado por Grand Wizard Theodore, e é aquela técnica usada por DJs onde intencionalmente você movimenta um disco para frente e para trás com a mão, “arranhando ele”, e fazendo aquele som típico do hip hop. Assim, os toca discos acabaram virando um instrumento para os DJs que, mesmo quando tinham apenas 2 discos, encontravam nessas técnicas múltiplas possibilidades de tocar as músicas.

Dentre os criadores do hip hop, precisamos falar por último, mas não menos importante, de Afrika Bambaataa. Foi ele que em dezembro de 1973, mesmo ano da festa do DJ Kool Herc, fundou a Universal Zulu Nation. Um coletivo que tinha como objetivo promover e espalhar a cultura hip hop pelo mundo através de princípios como a paz, o amor, a união e a diversão.

Em termos de sonoridades, Bambaataa trouxe a música eletrônica para dentro do hip hop. Inspirado em sons como o dos alemães do Kraftwerk, ele levou as bases de bateria eletrônicas, ou seja, os beats, e as batidas base pro rap. A partir disso, ele deu base para que surgissem gêneros como o miami bass, o freestyle e até mesmo o funk carioca. É dele a autoria da incrível Planet Rock, que virou um clássico do rap e da música eletrônica.

Já no Brasil, o hip hop só desembarcou de vez nos anos 1980. Na década de 70, a cena do grafite começou a se consolidar como uma resposta à ditadura militar, mas o hip hop mesmo como movimento deslanchou por aqui só no começo dos anos 1980, mais precisamente na estação São Bento do Metrô, no centro de São Paulo. Era ali que jovens de diferentes periferias da capital paulista se encontravam para ouvir os discos vindos do Bronx e dançar break. Por esse ambiente circulavam figuras essenciais para o hip hop brasileiro como Thaíde, Dj Hum e Nelson Triunfo. Foi ali também que Mano Brown e KL Jay se conheceram e no futuro vieram a formar os Racionais MC ‘s.

Outro marco histórico para o hip hop no Brasil foi a passagem do Public Enemy em 1984 por São Paulo. O show impactou uma galera que passou a conhecer a cultura hip hop. O rap começou a se popularizar e em 1988 aconteceu o lançamento da primeira coletânea de rap brasileira: Hip Hop Cultura de Rua, que foi produzido por Nasi e André Jung, do Ira!. Logo depois, em 1989, foi lançado Consciência Black, Vol.1, uma coletânea de grupos de rap que trazia, por exemplo, o primeiro registro dos Racionais MC’s e daí o resto é história…

1989 também foi importante para o hip hop na gringa. Foi nesse ano que foi criada a primeira categoria de rap do Grammy: a de “Melhor Performance de Rap”. Artistas como Salt-n-Pepa, DJ Jazzy Jeff & The Fresh Prince (Will Smith) e LL Cool J foram indicados, mas boicotaram o evento, pois a entrega do prêmio não seria feita na transmissão ao vivo e sim como se fosse uma “categoria secundária”. Acontece que quase 50 anos depois, o jogo virou e o hip hop ganhou até uma homenagem no Grammy de 2023.

No entanto, durante todo esse período apenas 2 vezes um disco de rap ganhou a categoria principal de “Disco do Ano” no Grammy. Em 1999, Lauryn Hill faturou o prêmio com o aclamado The Miseducation of Lauryn Hill e, em 2004, o Outkast ganhou com Speakerboxxx/The Love Below.

Mesmo ocupando os charts, protagonizando grandes festivais e virando até obra obrigatória de vestibular, como foi o caso com Sobrevivendo no Inferno, dos Racionais MC’s, a cultura hip hop ainda incomoda muita gente. Mas é exatamente isso que mantém ela viva, potente e transformando a vida de milhares de pessoas através da dança, da arte e da música.